Salua Ares | São Paulo, SP





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“Minha aldeia era rodeada de olivais, com oliveiras antigas de troncos enormes. Elas desapareceram. Senti-me como se tivessem me roubado a infância. Hectares e hectares de oliveiras desapareceram para dar lugar a culturas mais lucrativas. A aldeia não mudou tanto, foi a paisagem que mudou. E essa mudança radical na paisagem foi, para mim, uma espécie de golpe no coração. Regressar a Azinhaga, agora, é regressar a outro lugar que já não é o meu. A gente, na verdade, habita a memória. A aldeia em que nasci só existe em minha memória”. José Saramago
Em Azinhaga busco tocar a relação indissociável entre histórias de vidas e os espaços físicos onde essas histórias aconteceram: toda memória tem seu cenário. Se por um lado, com os processos históricos que transfiguram as paisagens, muitos lugares passam a existir apenas na memória (e nas fotografias antigas), por outro, os espaços físicos que serviram de palco, e os próprios materiais que deram corpo a esses espaços, e que foram sendo soterrados, arrancados, empilhados, também contêm as memórias que por eles passaram. Invisíveis a olho nu, mas presentes como espectro. Partindo dessa premissa, nesse projeto venho explorando blocos de concreto (material que, a um tempo, corporifica o transformar das cidades) e fotografias de arquivos de pessoas com testemunhos semelhantes ao de Saramago.
Como primeiro passo, recorto partes dessas fotografias em alusão à memória fragmentária. Procuro nesses recortes sua estrutura visual essencial, seu desenho mais simplificado e potente. A partir daí, empilho os blocos de concreto (mesma operação da transformação espacial), construindo com eles uma versão tridimensional dos desenhos que anteriormente descobri. Crio, assim, pequenas esculturas abstratas que tangenciam os fragmentos de memória. As formas criadas corporificam um espectro, ao mesmo tempo em que respeitam sua essência intangível. Ao fotografá-las, lhes devolvo a mesma característica de imagem bidimensional do recorte fotográfico, mas, diferentemente das fotografias de família antigas, sem a intenção de presentificar uma lembrança.
Confira outras exposições da 7ª edição do Pequeno Encontro da Fotografia.